[MÚSICA] [MÚSICA] Maio de 2014, ainda não tínhamos plena noção do que o Zika causava e médicos começaram a registrar casos da Síndrome de Guillain-Barré Maceió, Alagoas. Julho de 2015, a neurologista Vanessa Wanderlinden atendeu, Recife, caso de gêmeos recém-nascidos, onde uma das crianças sofria microcefalia. Ela testou as crianças para as infecções que a gente já sabia que causam microcefalia, como: Sífilis, Rubéola e Toxoplasmose. E não encontrou evidência de nenhuma das três, embora o caso parecesse com infecção, já que só uma das crianças teve complicação. A mãe de Vanessa, também pediatra e neurologista, comentou com a filha como também estava atendendo sete novos casos de microcefalia. Comum, as pacientes delas tiveram os sintomas da febre por Zika durante a gestação, como a vermelhidão na pele. Começou aí a suspeita do que poderia ser a causa. No dia 22 de outubro de 2015, o estado de Pernambuco notificou o Ministério da Saúde sobre 26 casos de microcefalia. No dia seguinte, o próprio ministério, notificou a Organização Mundial de Saúde desses casos crescentes de microcefalia. E a tendência acabou só se agravando. Até maio de 2015, o Brasil só tinha uma média anual de microcefalia de 200 casos. Mas de maio a dezembro do ano seguinte, tivemos 2.366 casos confirmados no país, 1.804 deles no nordeste. Outros 3.183 ainda estavam investigação no começo de 2017. A atenção gerada pelos primeiros casos de microcefalia notificados e pela possível relação com o Zika, fez com que muitos médicos prestassem mais atenção e diagnosticassem novos casos de microcefalia, parte deles falsos positivos e, uma das medidas para contornar esse problema foi diminuir o diametro da cabeça do bebê, para diagnóstico. Restava saber se essa relação entre o surto de Zika e os casos de microcefalia era real. Esse novo conjunto de sintomas mudou a vida de muitas famílias, médicos e pesquisadores que trabalharam dias e noites para entender o que estava acontecendo. Duas linhas de estudo seriam importantes. Uma era acompanhar grupo de gestantes locais de risco para a Zika e ver como a gestação ia progredir entre as que contraissem a infecção. Outra era conseguir modelos de estudo- tanto animais quanto de células cultura- que pudessem esclarecer melhor como se dava a infecção pelo Zika. Boa parte das descobertas da relação entre Zika e microcefalia, de ambas as linhas de pesquisa, aconteceram bastante aqui no Brasil, ou mesmo fora, mas com ajuda de brasileiros. Dos primeiros estudos a mostrar os danos neurológicos fetos foi o caso de uma gestante eslovena, que veio para o nordeste, e contraiu Zika. E quando ela retornou para o seu país, descobriu complicações no desenvolvimento do feto e optou por abortar a gestação. Nesse caso, se descobriu o vírus causando danos no sistema nervoso. Pouco depois, o Zika foi detectado no fluído amniótico de duas gestantes Campina Grande, na Paraíba, o que mostrou que o vírus é capaz de atravessar a barreira placentária, uma coisa incomum entre Flavivírus. Ao mesmo tempo, o Zika foi detectado no cérebro de dois recém-nascidos, que morreram logo depois do parto. A outra via pela qual estabelecemos a relação entre o Zika e as complicações, foram os estudos com modelos animais, como o trabalho feito na Universidade de São Paulo que mostrou como o Zika é capaz de atravessar a placenta e comprometer o desenvolvimento nervoso até causar microcefalia embriões de camundongos. Com tantas evidências se acumulando, a dúvida que tínhamos sobre o Zika causar esse aumento casos de microcefalia, foi sanada. A precaução relacionar o Zika com microcefalia não foi à toa. Não se conhecia outro Flavivírus que causasse má-formação durante a gestação, os efeitos teratogênicos. E o último vírus para qual esse tipo de relação foi descoberto foi a Rubéola, há mais de 50 anos. Além disso, na época, não havia registro do aumento de casos de complicações gestantes nas ilhas do pacífico, por exemplo, onde o vírus já havia passado. Mas uma revisita aos dados da Polinésia Francesa, depois da suspeita com os casos no Brasil, revelou sim, aumento de 50 vezes no risco de microcefalia na Polinésia Francesa. Até mesmo a Colômbia, que havia questionado essa associação entre Zika e microcefalia no começo do surto, acabou se tornando, fevereiro de 2017, o segundo país com maior número de casos de microcefalia e má-formação associada ao Zika, no mundo, depois do Brasil. Efeitos teratogênicos são, normalmente, determinados de duas maneiras: quando há uma combinação entre os sintomas raros e uma exposição comum; e quando já há uma relação epidemiológica entre causas e efeitos. O vírus da Rubéola foi descoberto como teratógeno quando oftalmologista notou a incidência de Catarata bebês de mães que tiveram Rubéola durante a gestação. Álcool e más-formações conhecidas como Síndrome Fetal Alcoólica, também foram descobertas assim. Já o ácido valpróico- usado no tratamento de transtorno bipolar- foi descoberto como teratogênico, porque aumentava 20 vezes as chances de Espinha Bífida nos fetos, quando usado no primeiro trimestre da gestação. No caso do Zika, uma série dessas relações aconteceram. A exposição à doença aconteceu período crítico da gestação, principalmente no primeiro trimestre. Essa exposição também foi específica, no caso das grávidas que viajaram para locais com Zika, contraíram o Zika e depois voltaram para os seus países, e desenvolveram as complicações. Estudos epidemiológicos de qualidade também mostraram que o risco de microcefalia foi maior locais com mais casos de Zika. E estudos clínicos acompanharam não só o aparecimento dos sintomas de microcefalia durante a gestão, como também detectaram sintomas raros. Por exemplo, a presença da pele acumulada no escalpo, é muito rara outras formas de microcefalia. E para completar, os sintomas de microcefalia ainda foram demonstrados modelos animais, nos camundongos infectados pelo vírus. Passado o surto de Zika, temos panorama mais completo de como essas complicações se manifestam. As complicações mais comuns na gestação foram: microcefalia, calcificação intracranial e a morte de fetos durante, ou depois, da vigésima semana de gestação. Outras complicações de fetos, ou recém-nascidos, de mães que tiveram Zika durante a gestação, também envolvem o sistema nervoso central. Ventriculomegalia, que é a dilatação dos ventrículos laterais do cérebro; má-formação do corpo caloso; e má formação do verme cerebelar. Também ocorrem complicações mais raras como: menor crescimento intrauterino; anormalidades oculares, ou seja, no olho; e Atrogripose, que é a contração permamente ou a má formação de articulações. Outros sintomas se manifestam conforme os bebês envelhecem. Como, por exemplo: irritabilidade, dificuldade para engolir, ou disfagia e ataques epiléticos. A diferença no tamanho do cérebro entre os bebês microcefálicos e aqueles com desenvolvimento normal, pode aumentar ainda mais ao longo do desenvolvimento. Por isso, passamos a nos referir às complicações causadas pelo Zika como Síndrome Congênita do Zika Vírus; que envolvem essas várias complicações do sistema nervoso central, manifestadas pacientes que testam negativo para as outras infecções teratogênicas: Rubéola, Sífilis, Toxoplasmose, Citomegalovírus e Herpes. A maior parte das complicações congênitas foram encontradas fetos de mães infectadas no primeiro trimestre. Mas mais da metade das mães com infecção aguda no segundo trimestre, também tiveram fetos com calcificação cerebral. E fetos com 25 semanas ou mais também sofreram complicações do sistema nervoso central, e até morte. E nos casos de infecções dos meses finais da gestação, ainda foram encontrados problemas como insuficiência placental. As complicações aconteceram independentemente dos sintomas da gestante enquanto ela foi infectada pelo Zika. Gestantes sem sintomas também tiveram crianças com má-formação. Os casos de Zika chamaram muita atenção por conta dessas complicações inesperadas, e por se tratar de uma nova doença. Uma atenção muito justificada que permitiu ao Brasil reconhecer e agir, relação ao ocorrido, bem pouco tempo. Mas as condições que permitiram a circulação do Zika, principalmente a grande população de mosquitos Aedes, também contribuíram para a circulação de outros Arbovírus. Durante o mesmo período, a incidência de Dengue foi muito mais numerosa, no país todo. 2015, estávamos lidando com problema de Dengue com epidemia de mais de 1 milhão e meio de casos, quase o dobro do registrado 2014. No ano seguinte, 2016, tivemos quase 1 milhão e meio de casos de Dengue, novamente. E no nordeste, apesar de liderar casos de síndrome congênita, a incidência de Chicungunya, também, foi maior do que a de Zika. Por isso, também, veremos esse outro vírus nas aulas a seguir. [MÚSICA] [MÚSICA]