[MÚSICA] [MÚSICA] >> Inaugurando o nosso módulo de entrevistas eu trouxe o Marcelo Rigon que é presidente da IGDA Campinas. IGDA Campinas é, numa tradução livre seria Associação Internacional de Desenvolvedores de Jogos e é uma rede mundial de projetos colaborativos e comunidades de pessoas envolvidas com a área de jogos. Ele também é diretor da Ilex Games, que é uma empresa que desenvolve jogos aliando diversão e conteúdo não é? Responsável pela criação de mais de 200 jogos educativos para o portal educacional Clickideia, Marcelo. >> Isso. >> Isso, é reconhecido pelo MEC, esse portal. E Marcelo você está aqui para falar pouco sobre essa questão então da documentação de game, não é, do GDD ou Game Design Document. Provavelmente você já passou pela experiência de desenvolver games sem essa documentação e com a documentação também, não é? Conta para a gente pouquinho como que o uso da documentação influenciou o resultado final do seu trabalho. >> Aí Júlia, muito obrigado por me chamar para participar desse programa e basicamente assim, eu comecei eu era físico, formado Física na Unicamp então não tinha uma formação background da área de game design então justamente quando eu comecei a trabalhar na parte de jogos educativos a gente não escrevia Game Design, que eu nem sabia exatamente o que é que era isso. A gente praticamente era todos dos mini games curtos de uma semana ou menos e a gente simplesmente saía fazendo porque a gente achava que precisava. Só que começou a acontecer muita divergência aí de opinião. Então, sei lá, a gente tinha combinado com o pedagógico de fazer tal coisa e aí chegava na hora de entregar não, tinha monte de coisa para refazer e dizer sei lá que era combinado, que a gente fez, que a gente não fez [INAUDIBLE]. E a gente inclusive começou a adotar a ideia de fazer os testes de pen and paper para, então ok, antes de gastar o esforço de fazer o jogo então vamos fazer uma documentação vamos fazer teste se isso funciona e aí a gente parte para fazer os jogos. E isso fez que com que tipo, a gente, o jogo que era para durar uma semana estava durando mês ele voltou a sair mais ou menos uma semana. Alguns tinham alguma coisa que a gente tinha que refazer porque realmente foi uma coisa que quando foi na prática não era exatamente aquilo que precisava ser mostrado mas caiu, sei lá, para 10% dos jogos realmente teve uma refatoração pouco maior que não era erro de português no tutorial ou alguma coisa do gênero assim. E mesmo atualmente, como a gente já estava mais experiente, comecei a fazer uns jogos de celular e eu, como era teste de mercado assim, eu falei "Acho que não vai precisar fazer Game Design Document". E no final assim, o jogo ficou com metade das coisas que eu tinha planejado porque na conversa ninguém lembra de tudo o que foi conversado. Então mesmo tendo reunião toda semana para falar sobre o produto quando passava uma semana vinha a arte final, vinha essas coisas e não era o que eu tinha pedido e aí o trabalho de refazer acabava tendo custo muito grande de novo cima desse projeto. Então para mim é fundamental hoje fazer Game Design Document para ter ali uma linha base para todo o mundo seguir e saber que todo o mundo falando a mesma língua. >> Entendi, para alinhar bem os objetivos mesmo daquele projeto como você pensando na experiência que você vai transmitir através desse projeto. >> Isso. >> Legal. Então assim no processo de documentação você considera que a experiência que vai ser construída, para o jogador, no ato de jogar não é, você acha que o GDD facilita esse processo de criação, ou ele torna esse processo mais restritivo, por exemplo? >> O problema é como você implementa essa questão da documentação. Por exemplo o Chris Crawford, ele tem o livro On Game Design, não é, dele, que ele fala muito de uma figura que ele chama o Tiranossauro Rex das ideias. Que basicamente é o seguinte: ele fala que toda a pessoa que é profissional na área de game design ela tem que ser uma máquina de construir ideias de gameplay, ideias de estética para jogo. E aí, qual que é o processo que ele segue? Ele pega e ele gera centenas de ideias, dezenas de ideias antes de começar realmente a fazer jogo e aí ele deixa, essa parte tem que ser livre. Então ele vai ter as ideias mais loucas que ele conseguir pensar, ele vai ter e vai anotar algum lugar. Aí depois ele solta o Tiranossauro Rex para devorar todas as ideias que forem fadadas ao fracasso assim. Então ele vai tentando fazer testes básicos assim ou, mesmo pensando tipo "Se eu fizer isso aqui, com isso aqui, não, não vai ficar, vai ficar ruim, vai ficar desengonçado não vai dar para usar". Ou fazendo algum teste básico ou mostrando justamente para outras pessoas e aí ele começa a consolidar aos poucos, que inclusive essa é uma das coisas importantes de que na verdade existem várias documentações, não é? E a primeira que o pessoal costuma fazer é High Game Concept, que aí a gente faz uma descrição de uma página ou duas páginas, e você passa para outras pessoas da área de Game Design e fala "O que é que você acha?". Porque aí às vezes o seu Tiranossauro Rex não é forte o suficiente para destruir uma ideia com alguma falha ali e às vezes eu quero dar outro feedback, melhora sabe? Então desde o começo ir escrevendo é bom até para você não esquecer, às vezes teve uma ideia muito boa e você vai "Amanhã eu escrevo" e às vezes já é o suficiente para se perder. >> Aí, essa ideia da troca é interessante porque às vezes a gente costuma, principalmente quando a gente está começando a trabalhar com isso, a gente acha que a gente teve uma ideia genial assim e que "Nossa, nunca ninguém pensou nisto antes" e quando você vai apresentar para outra pessoa muita vezes ela já conhece algo parecido ou até tipo transmite uma referência diferente. Então é legal trabalhar esse, esse sistema assim numa, numa colaboração, não é? >> Com certeza. Que até é mito que sempre existe assim nessa área e de, de que você não pode contar as ideias para as pessoas porque elas vão roubar as sua ideia. Só que meu, eu tenho, quê eu? Já tenho, na gaveta das ideias minhas que sobreviveram que eu quero dia fazer eu tenho umas 10, 12 lá. Então dificilmente eu vou pegar a ideia de uma outra pessoa e falar "Não, eu vou deixar ali na gaveta todas as minhas ideias que eu já acho legal que eu tenho, para fazer essa desse outro cara porque deve ser mais legal que a minha" sabe? Não, todo o mundo ali é criativo, todo o mundo tem boas ideias, você tem que assumir isso, que você não é melhor que as outras pessoas assim. E você pode divulgar essa ideia, claro não para todo o mundo porque não tem para quê você contar, sei lá, seu sobrinho não é, a sua ideia porque ele não tem o ferramental para poder analisar uma ideia que ainda não foi construída, ainda não está elaborada. Mas outro game designer pode-te dar ótimas ideias, que não sei referências, às vezes até para ajudar a formatar a sua ideia. " pô, você tem você quer fazer jogo sobre psicopatia. Pô, você já olhou sei lá, o Hatred, já olhou o, sei lá, Limbo, que vai ser jogo dark e tal", e às vezes é jogo que você não conhece e realmente dá uma ajuda muito boa poder ver outras pessoas que trabalharam com isso. >> Legal você tem então uma rede de apoio assim com pessoas que sejam de áreas diferentes, não é, que tenham visões diferentes mas que têm repertório legal para contribuir criticamente com o que você está propondo então não é? Acho que o IGDA, a ideia dele, assim a proposta seria justamente trabalhar pouco com esse tipo de rede, não? >> Sim, sim, a IGDA ela costuma... Cada cidade é diferente, a IGDA, porque ela vai se moldando com as necessidades do local assim, mas a ideia dela, original, que foi criado pelo Ernest Adams, você já tinha a ESA, que já era uma associação que ajudava empresas, só que as pessoas elas estavam lá, elas só iam realmente começar a trabalhar, começar a ter feedback quando entrassem numa empresa. Então eu falei "Vou criar uma associação aqui para juntar as pessoas" E aí as pessoas discutem, trocam ideias, dá dicas, às vezes conversando com uma pessoa num café, ou tipo num evento desses, a pessoa é contratada e ela fala "Pô, aquele cara ali era ótimo artista, era ótimo programador, vou chamar ele para trabalhar com a gente aqui." >> Legal, interessante. E qual conselho que você daria assim para o pessoal que está começando a criar os próprios games agora, com relação principalmente essa importância de trabalhar com uma documentação, assim. >> Essa é uma questão muito importante assim, de você ter uma documentação e é assim: não tem uma certa. Se você procurar na Internet você vai encontrar vários modelos, templates de Game Design Document que você pode seguir e até muitas coisas dependem do que você vai fazer assim. Mas é importante até por você que, por exemplo, tenho jogo que eu comecei a fazer à 12 anos atrás, e aí o pessoal dispersou cada foi para lado, tem gente que está no Canadá, tem gente que está tipo São Paulo, tem gente que está lá na Europa, só que esse projeto ficou e eu nessa época eu escrevi esses documentos. Aí agora como está muito mais fácil trabalhar à distância o pessoal me procura "Pô vamos fazer de novo esse jogo, esse jogo era muito legal, a gente já tinha vários concept arts do jogo, vamos tentar ressuscitar ele?" E pô foi 12 anos atrás, se fosse pela memória não ia ter como. Tanto que até o artista, eu passei para eles o arte conceito e ele falou "Caramba eu não sabia que a gente tinha feito tanta arte conceito!" Mas porquê? Porque estava tudo documentado lá. >> Legal. >> E mesmo a gente, sei lá dia eu acordo de mau humor, vai mudar as pessoas que eu acho legal e que eu não acho legal. Então se ficar só pela minha memória, com certeza vai mudando essa ideia e eu vou acabar nunca chegando no final do jogo porque eu não documentei as coisas e vão sendo tipo da minha cabeça, então com o tempo vai mudando e não sinceramente para melhor. >> Marcelo muito obrigado pela sua participação, de verdade, agradeço a sua presença aqui no nosso curso. >> Eh, eu que agradeço Júlia. >> Na nossa próxima entrevista a gente vai falar pouquinho de framework MDA no processo de game design. [MÚSICA] [MÚSICA] [MÚSICA]