Vamos agora nos mover para uma outra dimensão de nosso problema, que é o território como suporte da população. E este é provavelmente um fator muito importante para entender a transformação da ordem global atualmente. Vamos ter em mente que em 1800 havia somente 1 bilhão de pessoas no mundo. No final dos anos 1950, nós éramos 3 bilhões, mas agora o mundo tem 7 bilhões de pessoas. Esta transformação é o maior fator de instabilidade e explica por que o que foi possível, no século XX não é mais útil e mesmo significativo agora. Ela explica também por que a política não pode ser agora considerada como ela era antes. Este é o novo mundo, e este novo mundo apresenta algumas características que eu proponho levarmos em conta a partir de agora. Em primeiro lugar, vocês sabem disso, mas eu acho muito importante de ressaltar, metade da humanidade está localizada entre o subcontinente indiano e o Japão, em um território que é quase o o dobro do território europeu. Isso quer dizer que, no Sul e no Leste da Asia, um indivíduo em cada dois está localizado nesta parte do mundo. E nesta parte do mundo, a densidade demográfica teve, por muito tempo, uma densidade rural muito forte, criando sociedades rurais de um jeito que nós não poderíamos imaginar através da nossa história europeia. E, agora, essa densidade rural se transfomou em uma densidade urbana com uma verdadeira explosão, uma proliferação de cidades por toda a Ásia e agora também, e cada vez mais, na América Latina e na África. Nesta parte do mundo, seis países possuem mais de 100 milhões de habitantes. Este poder demográfico é uma nova dimensão da geopolítica que nossa visão europeia não pode ignorar. Com esta evolução, com esta transformação da população mundial, nós descobrimos que velhas potências serão potências secundárias, se compararmos às novas potências demográficas. Em 2050, a França terá cerca de 50% da população da Etiópia, e o Irã terá cerca de 120 milhões de habitantes. Vocês podem imaginar que neste mundo que foi moldado pela Europa e considerado por ela como sua própria criação, a capaciade real, a capacidade demográfica do mundo asiático, e depois do mundo africano transformará totalmente as principais características do equilíbrio política global. Agora, um outro ponto deve ser enfatizado, a África corresponde atualmente a 1/7 da população mundial, mas, em 2050, um indivíduo, um ser humano em cada 4 será africano. Nós podemos facilmente imaginar que em 2050 a África desempenhará um papel que é complemente diferente daquele que agora é atribuído a este continente. Agora, eu gostaria de destacar 3 dimensões dessa demografia global. A primeira é o envelhecimento. A segunda, a urbanização. A terceira, a migração. Um dos principais parâmetros da transformação demográfica global é o envelhecimento de uma parte do mundo, mas, por outro lado, a parcela das pessoas jovens cresceu em outras áreas do mundo. A população europeia e japonesa esá envelhecendo, e esse é um problema grave, especialmente no Japão, em que se afirma que, em 2030, se o Japão quiser manter o mesmo nível de população ativa, ele terá que hospedar cerca de 30% de migrantes. Essa é uma profunda transformação para esse tipo de sociedade. Mas o futuro econômico, o futuro social, e até mesmo o futuro político da Europa estão também claramente condicionados por esse envelhecimento populacional que é muito preocupante. Mas, ao mesmo tempo, o crescimento da população jovem criou outros problemas, especialmente, é claro, nos países em desenvolvimento. Vamos levar em conta o caso do Níger, este país africano francófono. Em 2030, 74% da população terá menos que 30 anos de idade. E esta proporção será de 62% para toda a África, quando na Europa a proporção será de 29. Vocês veem a diferença e o que isto significa. Atualmente, 200 milhões de africanos estão entre 15 e 24 anos de idade, estão sem emprego, ou com uma pequena chance de conseguir trabalho, esta ociosidade pode gerar violência e pode fazer com que sejam até mesmo atraídos pelo status de crianças-soldados. Um outro aspecto poderia ser o crescimento da classe média, que é provavelmente um dos principais parâmetros da transformação das estruturas sociais no mundo. A classe média está crescendo fortemente, especialmente nas potências em desenvolvimento, Brasil, China, Índia e assim por diante. Agora, nós consideramos que 3 bilhões de pessoas estão na classe média, em nosso mundo atual. Eles serão 5 bilhões em 2030. Isso implica novos valores, novas formas de consumo, novas estruturas sociais, e, provavelmente, novos tipos de representação política. Agora, a urbanização do mundo é uma dimensão crucial desta turbulência demográfica. Em 1975, apenas 3 cidades do mundo tinham mais de 10 milhões de pessoas. Em 2050, haverá 27 cidades que contarão com mais de 10 milhões de pessoas. Na África, em 1960, período em que começam os processos de independência e descolonização, havia apenas 53 milhões de pessoas vivendo nas cidades. Agora existem mais de 400 milhões e 50% deles estão vivendo em favelas. A urbanização, como eu mencionei, é uma dimensão fundamental do nosso tema, por uma razão muito simples que foi adequadamente analisada por Karl Deutsch. Deutsch aponta que a abrupta e maciça urbanização cria uma mobilização social anárquica, e esta mobilização leva à violência, ao radicalismo, para protestar, e, obviamente, observamos que o Islã radical tomou raízes em partes recentemente urbanizadas do mundo muçulmano. A organização Irmãos Muçulmanos foi criada no delta do Nilo quando a revolução islâmica aconteceu em Teerã, no momento em que a cidade contava com cerca de 10 milhões de pessoas. Este novo fundamentalismo aproveita-se da urbanização, Das novas redes de recrutamento e de compromisso e essas redes estão concectadas às socidades tradicionais e, assim, a religião e uma visão fundamentalista e radical da religião desempenham um importante papel. Vamos voltar agora para a migração, que é provavelmente o aspecto mais controverso dos problemas demográficos do nosso mundo atual. Um migrante é toda pessoa nascida no estrangeiro e que não é cidadã do país de acolhimento. Em 2002, um relatório das Nações Unida indicou que a migração indicou que a migração deveria ser considerada como um bem, porque a migração está desenvolvendo funções muito positivas. Primeiro, a migração está compensando o envelhecimento das sociedades desenvolvidas. A migração também é capaz de ocupar-se de trabalhos rejeitados, cobrir os altos custos sociais de despesas e pensões. A migração não corresponde aos principais pontos de um senso comum que é abordado pela retórica política. Em primeiro lugar, a migração não é uma invasão, não é massiva. Sabemos agora que a migração envolve cerca de 3% da população mundial, apenas 3%, e há 50 anos ela era de cerca de 2 ou 2,5% o que reflete uma mudança muito pequena. Claro que, em 1965, contávamos cerca de 75 milhões de migrantes, e agora está em torno de 200 milhões, porque a população mundial aumentou mas não é essa invasão tão numerosa que foi prevista por muitos observadores. O segundo ponto que temos de ter em mente é que a migração é um sofrimento. Em primeiro lugar, o sofrimento das pessoas que têm de abandonar sua aldeia, sua família, suas redes sociais comuns e ir para o estrangeiro, para um país que não é bem conhecido, onde eles não serão devidamente hospedados, e onde terão de assumir um risco. Por exemplo, em 2014, apenas durante um ano, 3500 pessoas morreram no Mediterrâneo, quando tentavam atravessar o mar para entrar na Europa. Antes de tudo, isso é uma tragédia, um desastre para aqueles que se arriscam a fazer isso. Terceiro ponto, a migração é também uma normalidade em um mundo global. Em um mundo global, o migrante é, provavelmente, o futuro da humanidade, ou seja, estamos em um mundo que é cada vez mais comunicativo, que é cada vez mais transnacional. E como seria possível resistir a esse apelo de migração criado pela transformação da população nas sociedades desenvolvidas e em sociedades em desenvolvimento. Tenha em mente que, durante os próximos 25 anos, a Itália vai perder cerca de 3 milhões de pessoas de sua população ativa, quando a Argélia terá 25 milhões de pessoas a mais na sua população ativa. Como pode um argelino resistir a este apelo e a esta discrepância ? A migração é também a fonte principal de hibridização da população. Agora, nós estamos entrando em um mundo no qual a etnicidade não está mais a moldar a ordem mundial em cada Estado-nação, em cada território, nós temos uma população híbrida. E esta hibridização cria um novo tipo de sociedade, em que mais e mais pessoas estão dependendo de suas sociedades de acolhimento, mas também da sua sociedade de origem e também, em algum momento, na sociedade de trânsito. Esta migração está criando um novo tipo de humanidade em que cada vez mais as origens e as referências são diversificadas. As migrações criaram as condições de uma globalização das questões. Com elas, questões nacionais são menos e menos domésticas e cada vez mais internacionalizadas. Os eventos no Oriente Médio ou na África também estão se tornando eventos na Europa, através das migrações, desta rede global de pessoas e através desta nova Internet que é cada vez mais estruturada e que cria novas formas de comportamentos sociais. Isso é a modernidade.