Nos anos setenta começou, provavelmente, uma nova etapa na história regional do mundo. Vamos lembrar que os anos setenta foram o fim destes famosos trinta anos de desenvolvimento econômico e do progresso econômico na Europa. Em 1973 foi a primeira crise do petróleo que atingiu as economias ocidentais. Mas os anos setenta foram, provavelmente, a década marcada pela emergência de uma globalização à qual o mundo estava transitando de um mundo interestatal para um mundo global. E, neste ponto, durante os anos setenta, a integração europeia foi fortemente contestada e questionada, enquanto o arranjo institucional não funcionou mais. Então, neste momento foi inventado um novo tipo de integração regional que nós chamaríamos neoregionalismo, integração neoregional. O que significa em primeiro lugar? Isso significa um novo contexto como já referi, um contexto de crise econômica, de crescimento de um novo mundo global, um papel crescente dos atores transnacionais, e especialmente corporações multinacionais, um mundo de comunicação, ou seja, um mundo cada vez menos territorial. Este novo regionalismo é neste momento um fenômeno global. Quer dizer não limitado à Europa, como foi com o regionalismo tradicional, mas que afetou todos os países, todas as partes do mundo. Na verdade Europa foi afetada primeiro por essa transformação, mas não foi a Europa que inventou este novo regionalismo. Este novo regionalismo veio da Ásia, veio do Extremo Oriente que foi fortemente transformado. É o ponto de partida da transformação da China, mas é também o momento quando novos atores econômicos apareceram na Coréia, em Taiwan, em Cingapura, nas Filipinas, na Tailândia e assim por diante. Este novo regionalismo teve claramente um alvo: como salvar o Estado em um mundo global turbulento? Como salvar o Estado, que foi neste momento ameaçado por estes novos atores transnacionais? Mas estamos diante de um outro paradoxo. Você se lembra o paradoxo que eu mencionei sobre regionalismo tradicional. Este paradoxo está agora revertido. O novo regionalismo não tinha como alvo o fim do Estado mas sim salvar o Estado que foi ameaçado por esta nova globalização. Mas, neste momento, os Estados foram enfraquecidos e não foram capazes de ter no comando este novo regionalismo. Este novo regionalismo foi então promovido pelos novos atores, pelos agentes econômicos, atores sociais, atores transnacionais mais do que Estados que eram mais passivos e até mesmo marginalizados, especialmente na Ásia. É um novo paradoxo, como este regionalismo visando a salvar os Estados, foi promovido pelos atores transnacionais não estatais. Como podemos caracterizar este novo regionalismo? Primeiro de tudo, ele nunca foi realmente teorizado. Isso é para dizer que não encontramos sobre o novo regionalismo o equivalente de um David Mitrany, por exemplo, que citei em minha última palestra. Este novo regionalismo é muito mais pragmático, não tem sido teorizado e, asim, está mais nas mãos dos atores do que na mente dos pensadores. Os novos atores são agentes econômicos que estão jogando um papel muito importante como eu mencionei mas também alguns atores políticos. Os da Ásia, que queriam fomentar uma nova ordem asiática. Eu mencionei, por exemplo, Mohamad ibn Mahathir na Malásia ou Lee Kuan Yew em Cingapura que estavam promovendo uma visão de uma Ásia, que poderia ser integrada além das fronteiras dos Estados-nação. Outra característica, e no meu pensamento é a principal, é que este novo regionalismo foi promovido por sociedades, e por economias mais do que por políticas. E isso é algo muito interessante observar como agentes econômicos na Ásia a partir dos anos setenta promoveram uma integração pragmática; apesar das fronteiras, em uma parte do mundo que foi, no entanto muito conflitante e muito intensa na competição política. Mas o que é interessante observar, é que é precisamente nesta parte do mundo, a, politicamente, mais competitiva, que esta nova integração se desenvolveu e que foi baseada em atores econômicos. E nós encontramos, por exemplo, os trabalhos do estudioso japonês Kenichi Ohmae, falando de <i>Estados-regiões</i>, para designar as dinâmicas econômicas e sociais das regiões para superar a ordem política clássica, a ordem política tradicional baseada em territórios e fronteiras. Mas vou mencionar especialmente Robert Scalapino, quem analisou a transformação da geografia asiática, salientando sobre o papel do que ele chamou território econômico natural (TEN). E ele explicou que há agora uma dinâmica, uma dinâmica econômica entre as economias da Ásia oriental, que estão conduzindo este processo de integração; ignorando a dinâmica política e os conflitos políticos. Na época em que foram construídos na Ásia os famosos "triângulos de crescimento", no momento em que os investidores provenientes de Taiwan foram conquistando a terra principal Chinesa se assentando e desenvolvendo as suas atividades nesta parte da China sem visto, sem controle político, sem contenção política. É o momento em que foram desenvolvidas estas famosas "zonas econômicas especiais" ao longo das margens da China. É o momento em que até mesmo Coréia do Sul e Coréia do Norte estavam cooperando para a construção da famosa zona especial de Kaesong, em que os trabalhadores norte-coreanos estavam trabalhando sob a supervisão das corporações sul-coreanas. Este novo tipo de integração é então realizada a partir de baixo, a partir da sociedade. A política foi neste momento limitada para seus próprios interesses estritos, isso quer dizer a competição política. O que é fascinante provavelmente, é que essa concepção de uma integração regional vindo de baixo, foi estendendo-se a todo o mundo. Descobrimos isso na América Latina, ate mesmo na América do Norte através do NAFTA mas a descobrimos também na Europa. e neste momento a Europa enfrentava uma forte crise institucional incapacitada de progredir em suas infraestrutura institucional. E neste momento atores não-políticos, atores não-estatais desempenharam um papel muito importante para dar uma nova dinâmica da integração europeia, através da cooperação regional, cooperação econômica, cooperação social, intercâmbio de estudantes e assim por diante. Estamos agora neste novo mundo, quer dizer mundo onde as instituições não podem se adaptar realmente, são resistentes, são resilientes e quando o progresso é proveniente de dinâmicas sociais. Se a Europa não colapsou totalmente é graças aos atores sociais, às instituições não estatais, aos estudantes Erasmus, à cooperação entre as empresas europeias e assim por diante. Este novo regionalismo esta comprometendo, provavelmente, nossa visão da política e, provavelmente, a nossa visão de democracia. Porque ele não é mais controlado, contido pelas dinâmicas políticas provenientes da soberania do povo. É por isso que a Europa agora provavelmente está ameaçada por uma nova crise, mesmo que fosse capaz de sobreviver graças a essas novas dinâmicas.